
Helena Salim de Castro; Ramon Blanco
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 20, n. 1, e1538, 2025
17-23
Anzaldúa argumenta, em seus trabalhos, que é necessário rejeitar e resistir contra
os rótulos rígidos e as identidades unitárias. Em sua vida e em seus escritos
(que se misturam), a autora olhava para aqueles/as que habitam as fronteiras,
que se encontram entre dois mundos, que estão em “nepantla”. Essa palavra,
originária da língua asteca Nahuatl, significa “terra entre meio” e refere-se ao
“espaço transicional”, “intermediário”, sem fronteiras claras, no qual as “auto
concepções e visões de mundo individuais e coletivas são destruídas”. É o espaço
em que, como explica Keating (2005, 1, tradução nossa), se desmancham aquelas
“categorias aparentemente fixas — baseadas em gênero, raça, etnia, sexualidade,
status econômico, saúde, religião31”.
Segundo Ortega (2005, 79, tradução nossa), para além de um espaço geográfico,
nepantla “é a própria experiência daqueles que vivem uma vida intermediária
porque são multiculturais, multifacetados, múltiplos, porque seu ser está preso
no meio de ambiguidades, contradições e múltiplas possibilidades
32
.”. As pessoas
que vivem nesses espaços são chamadas, por Anzaldúa, como “nepantleras”: são
os que “vivem dentro e entre os múltiplos mundos” (Keating 2005, 2, tradução
nossa). Além disso, nepantla também “indica um espaço/tempo de grande
confusão, ansiedade e perda de controle” para aqueles/as que o/a habitam
(Keating 2005, 6, tradução nossa). Segundo Anzaldúa,
Nepantla é uma terra desconhecida, e viver nessa zona liminar significa estar
em um estado constante de deslocamento — um sentimento desconfortável,
até mesmo alarmante. A maioria de nós mora em nepantla a maior parte
do tempo, ela se tornou uma espécie de “lar”. Embora esse estado nos
conecte a outras ideias, pessoas e mundos, nos sentimos ameaçados por
essas novas conexões e pela mudança que elas geram
33
(Anzaldúa apud
Keating 2005, tradução nossa).
As pessoas localizadas na “fronteira”, em “nepantla”, vivenciam o que
Anzaldúa chama de um “terrorismo íntimo”. Essa é uma sensação de constante
medo, de não identificação com nenhuma das culturas existentes — com nenhum
31 Original: “Apparently fixed categories—whether based on gender, ethnicity/ ‘race,’ sexuality, economic status,
health, religion, or some combination of these elements and often others as well—begin eroding. ”.
32 Original: “it is the very experience of those who live an in-between life because they are multicultural, multivoiced,
multiplicitous, because their being is caught in the midst of ambiguities, contradictions, and multiple possibilities. ”.
33 Original: “Nepantla es tierra desconocida, and living in this liminal zone means being in a constant state of
displacement—an uncomfortable, even alarming feeling. Most of us dwell in nepantla so much of the time it’s
become a sort of “home.” Though this state links us to other ideas, people, and worlds, we feel threatened by
these new connections and the change they engender. ”.