
Rev. Carta Inter., Belo Horizonte, v. 12, n. 2, 2017, p. 126-149
137
Hércules Paulino de Souza
de famílias e pequenas comunidades. Além disso, devido ao firme controle
dos meios de comunicação de massa naquele período, a população chinesa
não possuía meios para conhecer o tratamento falso dado pelo Japão sobre
a história da guerra, tal como o discurso acima mencionado proferido por
Tanaka na Dieta, a omissão dos crimes de guerra nos livros didáticos e as
visitas de líderes políticos ao Santuário de Yasukuni
13
que posteriormente
se tornou o ponto focal da discordância política sino-japonesa. (HE, 2007,
p. 6 – tradução nossa)
14
A fase majoritariamente positiva da relação seria passageira e a década de
1980 trouxe mudanças importantes na utilização do nacionalismo na China.
O declínio progressivo da ideologia marxista-leninista nas décadas posteriores às
políticas de reforma e abertura econômica levaram o Estado chinês e o Partido
Comunista a progressivamente utilizarem o nacionalismo para preencher esse
vazio ideológico e diversificar as bases de sua legitimidade (CUI, 2012; EKMAN;
PAJON, 2015; YUAN, 2008; ZHANG; WEATHERLEY, 2013).
Quando a população chinesa passou a aceitar a amizade sino-japonesa,
o governo chinês renovou a narrativa da guerra, na década de 1980. Isso ocorreu
devido ao declínio da ideologia comunista já mencionado, e ao fato de que as
reformas do então governo de Deng Xiaoping sofriam forte oposição da ala mais
conservadora do Partido Comunista chinês e de parte da população que sentia
os efeitos negativos das reformas que tomavam curso. Então, na nova estrutura
de ideias legitimadoras do Partido que se estabelecera, o patriotismo passaria a
ter função principal, onde se pregaria o amor pela nação e a grandeza da China,
assim como o Partido Comunista se afirmaria como guardião do patriotismo.
13 O Santuário de Yasukuni foi criado em 1869, com o objetivo de “confortar os espíritos” e honrar a memória
daqueles que lutaram e morreram pela causa imperial, entre eles os soldados japoneses mortos em guerra.
Dentre os soldados homenageados, estão criminosos de guerra Classe A – julgados pelo Tribunal de Crimes de
Guerra de Tóquio – que foram consagrados em 1978, entre eles o General Hideki Tojo. Por honrar a memória de
tais indivíduos, o local é alvo de críticas dos países invadidos pelo Japão durante a Segunda Guerra Mundial.
Governos da Coreia do Sul e China, por exemplo, alegam que as homenagens feitas a criminosos de guerra no
santuário denotam um caráter nacionalista e militarista ainda presentes na sociedade japonesa. O local também
abriga o museu militar Yushukan (SOUZA, 2015).
14 “prevented rigorous investigation of historical facts, and political gestures substituted sincere, concrete restitution.
Beijing’s attempt to create an illusion of Sino–Japanese friendship in the 1970s without first settling the historical
account was largely successful. Most young Chinese at that time had minimal knowledge about Japanese war
atrocities, for the state-controlled textbooks rarely mentioned them and academic research on this topic was
banned. Private stories about the ‘Japanese devils’ nevertheless survived, but only within families and small
communities. Moreover, because of the tightly controlled mass media at the time, ordinary Chinese people had
no way to learn about Japan’s false treatment of the war history, such as the aforementioned speech in the Diet
by Tanaka, textbook cover-up of war crimes, and leaders’ worship at the Yasukuni Shrine that later became the
focal point of Sino–Japanese political contention” (HE, 2007, p. 6).